Hoje a água da torneira tava saindo quente que nem sei. Procuro o botão do chuveiro elétrico mas tá desligado há semanas. Pra quê toalha? Acho que o ideal é ficar de roupa molhada. Não entendo bem a transição entre o molhado refrescante da ducha, e o molhado abafado do suor pingando. Por que que suor não refresca?
Boto uma compressa de gelo equilibrada na cabeça, no ombro, no pescoço, como um amuleto que esfrego tentando pensar. Como é o inverno? Falei no telefone um amigo no meio da neve. Essa palavra sozinha já derrete mal meus olhos leram. Não dá pra pensar em frio hoje. Que isso. Horas e horas, não dá nem pra cochilar de tarde.
Quisera um ar-condicionado, em traição a toda a revolta contra seu uso excessivo, a toda a recusa de sacralizar o frio e se agasalhar e amar o barulhinho tímido ronronando pra dormir; quisera um ar, entre amado e odiado, amuleto do desperdício e da arquitetura desalmada, contradição da terra tropical com a nossa insistência em trabalhar, em pensar friamente, olhando para uma tela de computador, em meio a essa descida massiva de luz laranja como um inferno, 40 graus hoje, sensação térmica de panela fervendo, deixa até tonto. Corpo pirado. Nem sei o que fiz, trabalho confuso.
Sol se pôs agora. Vitória, caramba, sobrevivemos. Alívio. Acho que o que mais fiz hoje foi aguentar mesmo. Que que o sol tanto tem que fazer nesse dia pra ficar assim tão perto. Deve ter uma boa razão. Quanto a mim, só lamento.
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André Aranha
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